É impossível visitar Maria José Ávila sem passar antes por seu jardim. No dia de nossa conversa as roseiras estavam em flor. Cores e espécies variadas, tratadas com capricho e que não cessam de encantar os olhos límpidos da poetisa. Em qualquer época do ano, sob chuva ou sol, sempre há florações pelo jardim. Elas jamais deixam de cercar essa casa térrea de uma rua tranquila na Vila Ferraz e de abraçar sua ilustre moradora.
A poetisa e artista plástica Maria José Ávila é um ícone cultural de Campos do Jordão, onde atualmente é Presidente da Academia de Letras. Sua atuação como professora criou uma legião de admiradores na cidade. Apreciadora da boa música, tem conhecimentos sólidos sobre o assunto. E seus livros sempre espargem versos sobre esta cidade que tanto ama.
Os livros fazem parte do DNA de Maria José Ávila. Eles a acompanham há muitos anos e, como gatos ordeiros, se acomodam nos recantos da casa. Mas há um local destinado especialmente para eles, uma espécie de hotel literário, uma pousada da escrita, onde eles vivem lado a lado, dando o tom do ambiente.
É preciso atravessar mais canteiros de flores, como que navegando entre folhas e pétalas para chegar à porta mágica. Um degrau sinaliza que precisamos elevar nossos espíritos. Assim que entramos vemos que há dois espaços, um à esquerda e outro à direita, cobertos com livros.
A organização é perfeita, tudo está arrumadinho. E esta não foi uma visita agendada para esta finalidade, ela aconteceu por estarmos lá, ou seja, não houve tempo para que nada fosse preparado.
O que encontramos retrata a realidade, um jeito de ser. Será que os livros são um pouco como os cães, que acabam ficando parecidos com seus donos? O último cão que ali viveu, o querido Skipper, que foi um grande companheiro para Zezé, tinha talvez o mesmo jeito dos livros. Esperto, amigo, tranquilo, pronto para todas as situações e sempre muito bem cuidado.
Quando pergunto como foi formada essa biblioteca pessoal, quem toma a palavra é a Professora Zezé, com sua clareza habitual. Ela diz que duas coisas a nortearam: “os livros de estudos para lecionar e os livros que gosto”. Simples assim. Fácil de entender, não é mesmo?
Na imensa seção dos “livros que gosto” há um pouco de tudo: poesia, romances, muitos títulos de aventura e do gênero policial, toda uma seção dedicada a livros em inglês. No total, são mais de 2.000 publicações. Sábia e generosa, Zezé não aponta favoritos.
Mas quando a conversa desliza para outros temas, aqui e ali pipocam alguns autores. Uma admiração especial pela poesia de Mário Quintana, por textos de J.G. de Araújo Jorge. Em uma das prateleiras, a presença de vários títulos da escritora escocesa Helen MacInnes. E muitos, muitos outros autores.
É possível conversar com uma poetisa sem falar sobre sua escrita? Ainda mais dentro de sua própria biblioteca? Que oportunidade!
Pergunto de onde vem a inspiração para escrever. A resposta é rápida e direta – da leitura e da música. Zezé sempre gostou de música e tem uma organizadíssima e imensa coleção de vídeos de óperas e concertos que assiste acomodada nas poltronas da acolhedora sala de estar. Com um sorriso maroto ela diz que os concertos e as óperas “criam o estado necessário para escrever”.
E os pensamentos para a escrita, como chegam? Zezé diz que, quando escreve, as poesias vêm mais ou menos prontas. Indago se no momento posterior à escrita, na maturação das ideias já colocadas no papel, na revisão dos textos, as mudanças são sutis ou radicais. A objetividade é total: “se a mudança for radical, suprimo”, ou seja, o texto não sobreviverá.
A visita termina com um olhar pelos quadros da casa. Vários deles são detalhados e precisos desenhos a lápis feitos por Zezé. O traço é fino, as cores delicadas e a beleza se faz presente. E a despedida, como a chegada, acontece entre as flores do jardim. É preciso dizer mais?
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